Volume 1
Número 1

20 de dezembro de 2004
 
 * Edição atual    

          A ética na pesquisa em saúde coletiva

Yara Coelho*

          O pesquisador deve estar atento ao significado de sua pesquisa perante a sociedade; qualquer metodologia utilizada interfere direta ou indiretamente na vida humana, atenção e crítica são elementos que devem constar em todas as etapas, independente de critérios estabelecidos.

          A base ética é a honestidade e o respeito que todo pesquisador deve utilizar. Pesquisas experimentais com seres humanos não devem ser feitas. O relacionamento de confiança entre o pesquisador e o sujeito não pode violar o princípio ético; criteriosamente, a pesquisa deve cumprir sua finalidade, a devolutiva à sociedade, verificando-se os riscos e benefícios da mesma.

          Ciência e consciência integram-se no projeto comunicativo de maneira única, de forma que os conhecimentos adquiridos pelos cientistas ou pesquisadores na área de saúde coletiva têm o pressuposto de transmissão, nada deve ou pode impedir o avanço da comunicação entre os pares ou a sociedade; é essencial que os avanços sejam públicos, transmitidos entre elementos das mesmas áreas e de forma útil para a saúde pública. Conciliar teorias de um saber e não interromper a cadeia de desenvolvimento científico em saúde coletiva é não deixar os ruídos comunicacionais interferirem nas mensagens entre pesquisadores e sujeitos.

          Porém, quem é o sujeito da ciência?

          A ciência procura um sujeito idealizado, identificado com a sociedade, coletivo, sem diferenças e produz um entrelaçamento de produções pessoais com estilos próprios, que dão origem a seqüências de artigos simplificados e a transmissão social dos conhecimentos é contínua.

          O sujeito da pesquisa em saúde coletiva deve ser procurado de forma a satisfazer as necessidades do pesquisador, entretanto, o mesmo precisa reconhecer que os questionários não podem levar ao sofrimento, por exemplo, nos casos de aborto ocorrido com adolescentes, ser criterioso com o ato de pesquisa, não deve haver humilhação, constrangimento, ignorar o sujeito de pesquisa e deixá-lo à mercê de seus sofrimentos ocasionados pelas questões que o pesquisador trouxe à tona. Existe o TCLE - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - que uma vez assinado, dá ao pesquisador o direito de fazer sua pesquisa. O relacionamento entre pesquisador-sujeito tem o sigilo como objeto principal. Abortos são crimes. Como ficam os adolescentes com relação ao tema? O TCLE dará ao sujeito o retorno que ele necessita e, caso menor de idade, o termo de consentimento livre e esclarecido é dado por quem? Pelos pais? Pelos responsáveis de instituições em que os menores estejam internos? Muitos dilemas éticos aparecem no decorrer de uma pesquisa e os comitês de ética devem estar preparados para solucionar e dar os pareceres de modo correto.Se a pesquisa é válida perante a ética e a sociedade, então, deve-se prosseguir. Em primeiro lugar está o sujeito, elemento respeitado e primordial para resolver questões em saúde pública, não pode ser considerado parte de populações descartáveis.

          A professora doutora Bader Burihan Sawaia acha que a resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde é a oportunidade para discussões das pesquisas. Na publicação da CONEP - Comuissão Nacional de Ética em Pesquisa - Ano III - nº 4 - abril de 2000, p.14-17, Bader afirma: "Vivemos um momento histórico de transformação do paradigma científico, que questiona o postulado de que o rigor científico por si só é ético por ser neutro, tanto que a Bioética virou disciplina e a ética, item importante de avaliação de pesquisas não só nas ciências biológicas, mas nas ciências humanas, exatas e na física. À medida que o mito da neutralidade científica é questionado, reaviva-se o debate saudável sobre a relação entre ciência e virtude. Aos critérios clássicos de avaliação de uma pesquisa, ao referencial teórico-metodológico, à definição dos objetivos, à coerência interna e ao procedimento, somam-se os pressupostos éticos e políticos que estão inscritos nos anteriores e nos motivos que levaram o pesquisador a definir determinado objetivo, a escolher determinados sujeitos para a sua pesquisa".

          Com relação às dificuldades nos experimentos com seres humanos, Bader Sawaia reafirma que todas as pesquisas têm implicações éticas, "a maioria das pesquisas em Ciências Humanas usa o homem como informante dos dados a serem analisados, tanto as de procedimento quantitativo, quanto qualitativo. Todos eles afetam o sujeito, não apenas os experimentos, mas as entrevistas e os questionários construídos dentro do maior rigor científico, pois o levam a refletir, recordar, criar expectativas, estabelecer relações".

          O processo educacional começa com o pesquisador, o qual deve saber tratar o sujeito com a dignidade merecida, porém, existem determinadas situações que a revelação do objeto da pesquisa induz a respostas, então, a omissão é cabível.

          Dilema: É ético omitir?

          Por esse motivo é que os comitês de ética devem cumprir o seu papel, ou seja, resolver e discutir todos os casos necessários para o prosseguimento das pesquisas , o rigor científico não é a neutralidade, é intrínseca a relação entre a honestidade e a clareza das palavras proferidas e escritas pelo pesquisador.

Com relação aos menores de idade deve-se estudar o Estatuto da Criança e do Adolescente e questionar se há outro fator a ser estudado, o ECA traz a legitimação.

          Um outro exemplo, no caso de um estudo sobre AIDS em adolescentes, qual procedimento adotado para dar o resultado dos exames? Esses riscos são decorrentes dos trabalhos efetuados em pesquisas em saúde coletiva, são problemas a serem enfrentados pelo pesquisador e pelos comitês de ética..

          A tarefa é uma só: repensar o ato ético a cada instante, refletir e defender a dignidade humana, como disse a mestre em Bioética, Elma Lourdes Zoboli, numa das aulas sobre Saúde Coletiva no Instituto de Saúde, em São Paulo.

          Zoboli cita no livro Bioética e Saúde Pública a característica principal da saúde pública: "Seu objeto é o processo saúde-doença da coletividade, observado em suas dimensões biológica, psíquica e sociocultural".

          A ética da pesquisa é dirigida à saúde da coletividade, é interdisciplicinar e multiprofissional, busca sempre a solução dos problemas reais de uma população ou de um grupo, exemplos assim são encontrados nas campanhas contra a dengue, menciona Zoboli. A contribuição do conhecimento e da arte das pessoas ligadas à sociologia e à ciência da comunicação: jornalistas e publicitários são necessários para a conscientização da sociedade dos problemas comuns a todos.

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Yara Coelho
Jornalista, especialista em Divulgação Científica em Comunicação em Saúde.

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